Se por um lado a gestão do tempo pode nos ajudar a ser mais produtivos, ela também pode nos ajudar a sermos menos. Isso parece contraditório, mas hoje em dia muitas pessoas padecem de uma certa dificuldade de “desligar o ‘modo trabalho’”.

Depois da pandemia do COVID-19, muitas pessoas passaram a trabalhar de casa. O home office passou a ser parte da vida de gente que nunca tinha imaginado ou desejado trabalhar dessa forma. Um dos efeitos colaterais disso foi a sensação de trabalho perpétuo: o ambiente do ofício se mistura com o da família e com o do lazer, de modo que as barreiras se tornam menos nítidas e o momento de parar de trabalhar não se torna nunca claro.

Assim, a produtividade pode se tornar um vício. Quando o trabalho possui um local próprio, é fácil “desligar-se do trabalho” quando se sai desse local. Se o trabalho nos acompanha nos celulares e computadores, parar de trabalhar se torna um desafio.

Mas isso não é um julgamento moral. Quando se pensa em vício, é fácil atribuir à pessoa que dele padece toda a responsabilidade pelo ato. No vício em trabalho, entretanto, não é apenas um “desejo doentio de trabalhar” que opera, mas também certas situações delicadas: cobranças, dificuldade de relaxar, o medo de um desastre iminente, a possibilidade do dinheiro acabar, a promessa, expectativa e o desejo de sair de uma situação ruim, relações desniveladas com chefes ou outras pessoas em posições diferentes na hierarquia da empresa. Encontrar uma forma mais saudável de transitar por entre essas relações pode ser um pré-requisito para poder estabelecer um relacionamento mais saudável com o trabalho e com a produtividade.

O estresse constante é sustentável por um determinado (curto) período de tempo, mas se isso se alonga em excesso, o desgaste começa a produzir efeitos: o cansaço se torna cinismo, a memória falha, o controle motor começa a dar defeitos, a atenção decai em qualidade e tudo, mesmo o mais simples, parece exigir o dobro do esforço para alcançar metade do resultado. É o que se chama de Burnout.

Certas diretrizes para uma mulher gestão do tempo podem ajudar com isso, mas embora um sistema auxiliar de cognição distribuída (que é o que são, essencialmente, as práticas de gestão do tempo) nos ajude a navegar pelo mundo, ele não o altera. É necessário assertividade, capacidade de dizer “não”, desapego do perfeccionismo; pode ser necessário reaprender a se divertir – tudo isso ao lado de um agir estratégico que leva em conta as situações materiais e éticas em que nos encontramos. É ademais vital compreender, profunda e afetivamente, que nem só de trabalho vive o homem.